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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Namoro

Viriato da Cruz, poeta angolano, foi considerado um dos mais importantes impulsionadores de uma poesia regionalista angolana, nas décadas de 40 e 50, e um dos lideres da luta pela libertação de Angola.
Na década de 60 tornou-se Secretário-Geral do MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola, partido esse que ajudou a fundar, juntamente com Mário Pinto de Andrade. Mais tarde, dissabores com Agostinho Neto irão obrigá-lo a abandonar o partido; Neto defendia um comunismo soviético e, Viriato, um comunismo maoísta.
Vai para Pequim em 1966, isto é, no início da "revolução cultural". Mais tarde, cai em divergências com os dirigentes chineses, os quais, contrariando a sua vontade, não o deixaram sair do país. Morre em 1973, tendo sido humilhante a forma como foi sepultado no cemitério dos estrangeiros.
Viriato da Cruz deixou-nos um dos poemas mais bonitos acerca dos namorados. O poema chama-se NAMORO e conta uma linda história de amor. Fausto fez a música que todos conhecem, mas, hoje, o que conta é o poema:

Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com letra bonita eu disse ela tinha
um sorrir luminoso tão quente e gaiato
como o sol de Novembro brincando
de artista nas acácias floridas
espalhando diamantes na fímbria do mar
e dando calor ao sumo das mangas

Sua pele macia - era sumaúma...
Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas
sua pele macia guardava as doçuras do corpo rijo
tão rijo e tão doce - como o maboque...
Seus seios, laranjas - laranjas do Loje
seus dentes... - marfim...
Mandei-lhe essa carta
e ela disse que não.

Mandei-lhe um cartão
que o amigo Maninho tipografou:
"Por ti sofre o meu coração"
Num canto - SIM, noutro canto - NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou

Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo, rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigenia,
me desse a ventura do seu namoro...
E ela disse que não.

Levei á Avo Chica, quimbanda de fama
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço forte e seguro
que nela nascesse um amor como o meu...
E o feitiço falhou.

Esperei-a de tarde, á porta da fabrica,
ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,
paguei-lhe doces na calçada da Missão,
ficamos num banco do largo da Estátua,
afaguei-lhe as mãos...
falei-lhe de amor... e ela disse que não.

Andei barbudo, sujo e descalço,
como um mona-ngamba.
Procuraram por mim
"-Não viu...(ai, não viu...?) não viu Benjamim?"
E perdido me deram no morro da Samba.

Para me distrair
levaram-me ao baile do Sô Januario
mas ela lá estava num canto a rir
contando o meu caso
as moças mais lindas do Bairro Operário.

Tocaram uma rumba - dancei com ela
e num passo maluco voamos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: "Aí Benjamim !"
Olhei-a nos olhos - sorriu para mim
pedi-lhe um beijo - e ela disse que sim


Viriato da Cruz

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